quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Análise do Soneto 01-Terceira Parte

Soneto 01

É gentil, é prendada a minha Altéia;
As graças, a modéstia de seu rosto
Inspiram no meu peito maior gosto
Que ver o próprio trigo quando ondeia.

Mas, vendo o lindo gesto de Dircéia
A nova sujeição me vejo exposto;
Ah! Que é mais engraçado, mais composto
Que a pura esfera, de mil astros cheia!

Prender as duas com grilhões estritos
É uma ação, ó deuses, inconstante,
Indigna de sinceros, nobres peitos.

Cupido, se tens dó de um triste amante,
Ou forma de Lorino dois sujeitos,
Ou forma desses dois um só semblante.

Glossário:

Grilhões: Cadeia metálica de anéis encadeados (no sentido figurado).
Estritos: rigoroso.
Semblante: fisionomia; no contexto poderia ter sentido da palavra ‘’criatura’’ ou da palavra ‘’ ser’’.

Interpretação:

Podemos perceber neste soneto a presença de pelo menos duas mulheres, ou seja, pelo menos duas pastoras a quem Gonzaga se refere.
Na primeira estrofe vemos que ele se refere a Altéia, que segundo o autor, tem o rosto gracioso e uma modéstia que não tem como não levar em conta.Observa-se também que Altéia é uma mulher cujo sua beleza e seu modo de ser inspiram mais do que a beleza do toque do vento no puro trigo:'' [...] As graças, a modéstia de seu rosto/Inspiram no meu peito maior gosto/Que ver o próprio trigo quando ondeia.’’
Na segunda estrofe, Dirceu admite que algo que Dircéia fez , acabou sujeitando-o a ela novamente e, o eu lírico considera isso engraçado, já que ele tinha a opção de não o fazer.Nota-se que o eu lírico refere-se à amada como Dircéia;
não mais usa o vocativo Marília, como nas liras anteriores. Entende-se que Dircéia é um nome referente a Dirceu (de Dirceu).
Quando anali
sa-se as duas últimas estrofes vê-se que o poeta termina seu soneto demonstrando seu desespero e por último fazendo uma súplica ao Cupido, pedindo-o que resolva sua situação, separando o casal definitivamente ou unindo-os como simplesmente um.

Características:

Observa-se neste soneto a presença de duas características árcades distintas:
Imitação dos antigos, onde os greco-romanos, que são considerados modelos perfeitos de equilíbrio, beleza e simplicidade são imitados, diretamente ou através do Renascimento. Essa imitação diz respeito aos temas, ao uso da mitologia como podemos ver no seguinte verso ‘’ Cupido, se tens dó de um triste amante [...]’’ e, sobretudo às regras de composição, que devem ser rigorosamente cumpridas (versos decassílabos e a rima optativa).
Distanciamento amoroso, onde a mulher é vista como um ser superior, inalcançável e imaterial.

Comentário sobre a situação histórica:
Não se têm muitas informações com relação à última parte do livro Marília de Dirceu, já que é uma publicação confusa, pois não se sabe ao certo quem a escreveu.
O que podemos levar em conta é que esta parte foi escrita após o exílio do poeta para Moçambique devido sua participação na Inconfidência Mineira. Apesar dos sofrimentos passados na prisão – conforme os tristes versos escritos no cárcere -, Gonzaga levou uma vida quase normal, casando-se, enriquecendo e envolvendo-se na política local. O poeta casou-se com a filha de um comerciante de escravos chamada Juliana de Sousa Mascarenhas, de 18 anos, o que é muito contraditório já que este era contra a escravidão. O que se pode garantir é que Gonzaga não deixou apenas sua prole, suas liras e seus sonetos, o grande Dr.Tomás Antônio Gonzaga e o pastor Dirceu deixaram para nós um enigma, que cabe a cada um resolver.


Marcone, n°
28, 1° ''A''.

3 comentários:

  1. A análise está completa, a interpretação foi esclarecedora e abrangente. Nota-se que este é um dos poucos sonetos em que Tomás cita Dirceia diretamente. As características árcades foram bem colocadas e o comentário sobre a situação histórica também. O que me chamou atenção foi o detalhe citado no comentário histórico sobre ser contraditório Gonzaga casar-se com a filha de um comerciante de escravos, uma vez que ele era contra a escravidão. Isso é realmente algo a ser pensado. Tenho uma pequena correção para fazer: no segundo parágrafo da interpretação, a colocação "uma mulher cujo sua beleza e seu modo de ser" deveria ser substituídas por "uma mulher cuja beleza e modo de ser...", na minha opinião. Apenas um detalhe. Como um todo, a análise está ótima.

    Roberta, nº 32, 1º "A".

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  2. A caracterização do poema foi muito boa, principalmente na descrição da estrutura decassílaba do poema. O histórico deu um bom plano de fundo para o soneto, apesar de nenhum soneto ter um contexto exato. A interpretação foi notável, mas acho que poderia haver uma segunda interpretação para o último terceto, além da separação ou união do casal, também poderia ser a separação ou união de Altéia e Dircéia, mas essa é apenas uma opinião. O trabalho feito foi excelente.

    Isabella, nº20, 1ºA

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  3. Sua análise no geral está bem esclarecedora e de forma compreensível. As características e contexto histórico foram bem objetivos. Algo que achei interessante foi que mesmo nas partes finais dessa obra, Dirceu cita o Cupido, um ser miológico, porém mais adiante vai amadurecendo nas palavras e esquecendo Marília pouco a pouco.

    Ruth Oliveira, nº 33, 1º "A".

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